02/11/2011
Manifesto da ocupação na USP-Butantã!
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Nós, estudantes da USP, organizados no  movimento de ocupação e com apoio dos trabalhadores, lançamos este  manifesto a fim de nos posicionarmos frente à sociedade sobre o que vem  ocorrendo na Universidade de São Paulo.
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Há uma política repressora que tem  avançado contra aqueles que lutam por uma Universidade pública. As ações  da reitoria da USP para aprofundar o processo de privatização tem se  intensificado – o que se produz dentro da universidade cumpre, cada vez  mais, o propósito de atender aos interesses do mercado em detrimento dos  interesses de toda população. Com o objetivo de desmontar o caráter  público da USP, a reitoria vem tomando medidas para eliminar as forças  de resistência na Universidade. Mais de 26 estudantes, além de vários  trabalhadores e professores, estão sendo processados por se manifestarem  politicamente, através de processos administrativos que visam a  eliminação e demissão da Universidade, e processos criminais que visam a  prisão.
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Com a justificativa de garantir a  segurança, o reitor da USP instaurou, por meio de um convênio, a  presença da polícia militar no campus. Com o avanço das perseguições  políticas fica evidente que o real objetivo da polícia militar na USP  não é o de inibir crimes, mas sim de inibir e combater manifestações  políticas e cercear o direito de expressão livre de estudantes e  trabalhadores.
Num contexto de crise sistêmica do  capitalismo, se evidencia, em todo o mundo, o papel da polícia como  aparelho armado de repressão aos movimentos sociais que resistem ao  avanço da desigualdade e ataques a direitos históricos da população. Na  Grécia, durante os protestos contra as políticas de austeridade, os  manifestantes têm sido duramente reprimidos. Em Londres e em Madri a  situação é muito semelhante. No Chile, um milhão de estudantes vão às  ruas exigindo uma educação pública e gratuita, e a violência contra  manifestantes é igualmente dura.
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No Brasil, os conflitos em 2009 em  Paraisópolis, a repressão cotidiana das UPPs aos moradores dos morros  cariocas, e as violências policiais contra ambulantes em luta no centro  de São Paulo indicam o mesmo sentido da atual militarização da USP: a  repressão policial são ataques àqueles que lutam por seus direitos  elementares. E essa repressão, destaque-se, é mendaz: a própria ONU,  entidade legitimadora do imperialismo, reconhece a polícia brasileira  como sendo a que mais mata no mundo.
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No dia 08/09/2011, o Reitor João  Grandino Rodas, sustentado institucionalmente por um Conselho Gestor  antidemocrático (apenas 30 % dos membros representam trabalhadores e  estudantes juntos), assinou um convênio com a Polícia Militar.  Para  mascarar os reais propósitos do convênio Rodas-PM, a reitoria da USP se  utilizou de maneira oportunista da morte do estudante Felipe Ramos de  Paiva, que ocorreu dentro do campus. O que foi omitido é que no dia do  assassinato a PM já estava agindo na universidade – inclusive fazendo  blitz em frente ao local da ocorrência. Nos últimos dias, para legitimar  as violências ocorridas na USP sem explicitar seu caráter político,  também se utilizaram de maneira oportunista do mote do “combate as  drogas” para, assim, justificar todo clima de medo que têm promovido  dentro da Universidade diariamente. Nos morros do Rio e em todas as  periferias brasileiras, a repressão possui a mesma faceta: se utilizam  de argumentos como o combate ao tráfico de drogas para atacar as  liberdades mais elementares de todo o povo pobre.
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O que a mídia não denuncia é que a  polícia que enquadra estudantes na USP por porte de maconha é a mesma  policia que age com o narcotráfico, recebendo o lucro das vendas com uma  mão enquanto reprime com a outra. O que a mídia omite é que a polícia  que invade casas na favela e atira em mulheres e crianças com a  justificativa de prender traficantes é a mesma polícia que é sócia do  tráfico. Isso expressa a hipocrisia de combater o narcotráfico nas  universidades e nas favelas, pois os verdadeiros promotores e  beneficiados desse mercado, um dos mais lucrativos do mundo, são as  industrias farmacêuticas, a polícia, as clínicas privadas, entre outros.
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Essa repressão tem avançado, pois a lei  vigente que supostamente descriminaliza o porte de maconha só funciona  como uma cortina de fumaça, erguida pelo sistema para dificultar o  aprofundamento do debate sobre a legalização da maconha e para  criminalizar a pobreza, movimentos sociais e ativistas políticos.
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A atuação da PM em nosso Campus na  última quinta feira (27/10) foi apenas mais um de uma série de episódios  de acuação de estudantes e servidores da USP pela PM. Na semana passada  estudantes da Escola Politécnica foram abordados dentro de seus Centros  Acadêmicos. Na Escola de Comunicação e Arte (ECA) um estudante foi  revistado pela polícia com a justificativa, no mínimo estranha, de  “olhar feio” aos policiais. Nos últimos meses, não foram poucas as  averiguações dentro dos Centros Acadêmicos, o que não impediu um roubo  no Centro Acadêmico da ECA, apenas uma semana após a revista da PM no  local. No dia que culminou com esta ocupação, professores e estudantes  foram abordados e revistados em frente à biblioteca da Faculdade de  Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH). E nessa mesma faculdade,  horas mais tarde, três alunos foram detidos por políciais da ROCAM. Ao  tentarem impedir a detenção desses colegas, deliberadamente defendida  pela diretora Sandra Nitrini, centenas de estudantes foram atacados com  bombas de efeito moral, gás lacrimogênio, spray de pimenta, cacetetes e  balas de borracha. Vários estudantes foram feridos. Respondemos como  pudemos – ou seja, correndo e arremessando paus e pedras.
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O discurso da reitoria tentou justificar  a intervenção policial utilizando de maneira oportunista o assassinato  de Felipe Ramos Paiva. Outros casos, entretanto, não foram igualmente  veiculados pela mídia e pela reitoria – e isso não foi por acaso. Um  desses casos foi o da morte do estudante Samuel de Souza, morador do  Conjunto Residencial da USP (CRUSP). Ele era negro, pobre, baiano e  estudava Filosofia. Samuel morreu dentro da USP por negligência médica  da reitoria em relação a uma política de saúde nos campi da USP. Também  houve a morte de Cícera, funcionária da lanchonete da Pedagogia,  assassinada na favela São Remo, decorrente de uma “bala perdida”  disparada pela Polícia. A hipocrisia do discurso da reitoria, que diz  combater a violência, fica claro quando sua própria política de  precarização foi responsável pela morte do trabalhador terceirizado de  limpeza, José Ferreira, em decorrência de um acidente de trabalho.
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Tais relatos nos impõe o questionamento: ao que se presta, de fato, a presença policial na USP?
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O objetivo real da presença policial é  garantir a execução de um projeto de universidade, ostensivamente  defendido pelo Reitor João Grandino Rodas. Esse projeto político busca  submeter a Universidade aos interesses de empresas e fundações privadas,  cujo único objetivo é a maximização de seus próprios lucros: e é por  isso que as pesquisas sem viés mercadológico são cada vez mais raras na  Universidade. A estrutura que sustenta tal projeto é referendada apenas  por um pequeno grupo de pessoas, imerso em relações políticas bastante  duvidosas com grandes empresas, fundações e o próprio governo do estado  de São Paulo. Com a diminuição da verba para trabalhadores efetivos, o  aumento da contratação de terceirizados, e sem garantias de contratação  de professores e reposição dos aposentados, a universidade que já é  fechada para a maioria da população, em especial pobres e negros, se  torna ainda mais exclusiva, elitista e mercadológica sob a administração  de Rodas, levada a cabo com a mão repressora da Polícia Cívil e  Militar.
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Simultaneamente à repressão policial,  que ocorre tanto na USP quanto fora dela, a reitoria tenta extinguir os  espaços políticos e culturais de organização dos estudantes, como o  Núcleo de Consciência Negra, que foi fundado há 23 anos na USP e até o  momento não foi legitimado pela universidade, sofrendo com ameaças de  demolição do barracão onde desenvolve suas atividades. O CANIL - Espaço  Fluxus de Cultura, um dos poucos espaços culturais estudantis da  USP-Butantã, sofreu uma tentativa de demolição, que foi barrada pelo  conjunto de estudantes. A Moradia Retomada, ocupada devido ao déficit de  vagas no CRUSP, continua ameaçada por um mandato de reintegração de  posse solicitado pelo Reitor. E o espaço do DCE Ocupado, após reforma,  seria re-inaugurado não mais como um espaço autônomo, mas como “Centro  de Vivência da Reitoria” – o que foi impedido pelos estudantes.
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A reitoria tenta silenciar todos os  movimentos de resistência da Universidade com uma avalanche de  processos. Os processos administrativos baseiam-se no Decreto 52.906, de  1972, Regime Disciplinar instituído sob a égide da Ditadura Militar,  que vigora no estatuto da USP como “disposição transitória” há algumas  décadas.  Segundo este decreto, são considerados atos de “indisciplina”  de estudantes, trabalhadores e professores, passíveis da punição,  expressa no artigo 248, inciso IV, de “eliminação”, as seguintes práticas: artigo 250 inciso VIII  - “promover manifestação ou propaganda de caráter político-partidário,  racial ou religioso, bem como incitar, promover ou apoiar ausências  coletivas aos trabalhos escolares (greves)” ; inciso IV -“praticar ato atentatório à moral ou aos bons costumes”;inciso II  “ (...)afixar cartazes fora dos locais a eles destinados”. As acusações  que baseiam os processos tratam ações políticas legítimas como desvios  de comportamento e são, ou questionáveis, ou deturpadas. Alguns dos  processos foram abertos com base apenas em Boletins de Ocorrência que  apresentam, como de praxe, uma versão unilateral dos fatos. No caso dos  processos criminais, coloca-se a ameaça de prisão de pessoas com base em  acusações forjadas pela Consultoria Jurídica da reitoria para levar a  cabo sua perseguição política. As testemunhas em favor da reitoria  geralmente são membros das chefias, das guardas ou outros que, tendo  vínculos empregatícios com o denunciante, têm seu testemunho enviesado.  Esta é uma das maneiras de se produzir as provas falsas. É no mínimo  estranho que tenha sido criada, por exemplo, uma delegacia especial para  tratar da repressão às ações políticas dos trabalhadores. Lembrando que  em 200 um dos diretores do Sindicato dos Trabalhadores da USP foi  demitido por lutar contra a precarização e terceirização na  universidade.  A reitoria tenta hoje preparar terreno para avançar  rapidamente com as punições contra estudantes, trabalhadores e  professores dissidentes da ordem privatista que vem sendo estabelecida.  Por isso decidimos cobrir os rostos: pela real ameaça de represália  política - e não porque somos ou nos sentimos criminosos.
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Por esses motivos, somos  contrários aos processos contra estudantes e trabalhadores e pela  revogação completa destes decretos e processos criminais e  administrativos! Somos pela revogação imediata do Convênio entre a PM e a  USP! FORA PM!
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Manteremos nossa ocupação até que todas as nossas reivindicações sejam atendidas.
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