20/06/2011
CONCEPÇÕES, RECONVERSÕES E PERSPECTIVAS PARA A CONSTRUÇÃO DA EDUCAÇÃO POPULAR
Jeferson Anibal Gonzalez1
O presente trabalho está organizado em três itens. No primeiro, aborda-se a questão da superação do conceito restrito de educação popular enquanto “educação para o povo”, partindo da especificidade da educação enquanto atualização histórico-cultural dos seres humanos, suas relações com seus determinantes sociais, políticos e econômicos, concluindo pela definição da educação popular a partir de sua organização aliada aos interesses das camadas populares.
A partir do reconhecimento do caráter de classe do Estado e, por conseguinte, das políticas sociais, no segundo item discute-se duas formas nas quais a educação é utilizada como elemento de persuasão para que a classe dominante se perpetue como tal, sendo eles a internalização dos valores culturais impostos por determinada classe e o processo de reconversão das reivindicações das camadas populares em elementos de manutenção do capital.
Por fim, como considerações, discute-se as perspectivas para a construção da educação popular indissociavelmente ligada à necessidade de superação do reformismo em favor de uma ruptura radical com a ordem estabelecida.
PARA ALÉM DA CONCEPÇÃO RESTRITA DE EDUCAÇÃO POPULAR
Instalada a era de fragmentações, diversificações e incertezas, necessitamos “colocar as cartas na mesa” explicitando alguns conceitos que até então pareciam óbvios, mas que estão sendo obscurecidos pela nova roupagem ideológica do capital. Comecemos pela própria concepção de educação enquanto atualização histórico-cultural dos seres humanos, que precisa ser defendida devido aos recentes ataques por parte do ideário pós-moderno ao campo educacional através das assim chamadas pedagogias do “aprender a aprender” (DUARTE, 2001), que negam a importância do ensino sistematizado e entregam os educandos aos limites do cotidiano naturalizante e alienante.
Na contramão dessa tendência, é preciso explicitar que o ser humano se diferencia dos outros animais pela capacidade de produzir sua própria existência e não simplesmente se adaptar à realidade natural. Para produzir sua própria existência é preciso que o homem aja sobre a natureza pela mediação do trabalho e a transforme em objeto de sua ação, criando assim um mundo humano - o mundo da cultura.
Podemos, pois, dizer que a natureza humana não é dada ao homem, mas é por ele produzida sobre a base da natureza biofísica. Consequentemente, o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. (SAVIANI, 2003,p. 13)
Entende-se que a educação, enquanto campo social que visa à formação de seres humanos, é palco de grandes embates ideológicos (ROSSLER, 2004). Nesse sentido, é preciso compreendê-la em sua historicidade e na relação entre sua forma institucionalizada – a escola – e seus condicionantes sociais, políticos e econômicos.
Indo de encontro ao que defendem as teorias não-críticas, compreende-se que a escola não está à margem da estrutura social, mas é historicamente determinada pela forma como se organiza a sociedade. Nesse sentido, a defesa de uma educação socialmente transformadora implica o reconhecimento das relações de dominação existentes na sociedade – e no processo educativo – com o objetivo de formar sujeitos que exerçam resistência a essas relações a fim de superá-las. Ao assumir a determinação social da educação como pressuposto, podemos correr o risco de cair nas armadilhas do crítico-reprodutivismo, que revela-se capaz de fazer a crítica do existente, de explicar os mecanismos do existente, mas não tem proposta de intervenção prática, isto é, limita-se a constatar e, mais do que isso, a constatar que é assim e não pode ser de outro modo. (SAVIANI, 2003, p. 64)
No entanto, sem negar a importância que o crítico-reprodutivismo desempenhou na crítica à pedagogia tecnicista e ao conjunto das teorias não-críticas, que compreendem a educação como a panaceia milagrosa que irá resolver todos os males da sociedade, compreende-se que a educação apesar de não ser a única responsável por um processo de transformação social, sem a mesma a luta pela hegemonia da sociedade na perspectiva das camadas populares fica comprometida, inviabilizando qualquer transformação.
Compreendendo a historicidade da educação e seus determinantes sociais,Saviani (1999, p.171-172) identifica na modernidade o marco que elevou a escola à forma dominante de educação:
Em síntese, pode-se dizer que à dominância da indústria no âmbito da produção corresponde a dominância da cidade nas relações sociais implicando, em ambos os casos, a generalização das funções intelectuais e a objetivação das operações abstratas, quer dizer, a incorporação de procedimentos formais à vida social em seu conjunto. E se a máquina viabiliza a materialização das funções intelectuais no processo produtivo, a via encontrada para se objetivar a generalização das funções intelectuais na sociedade foi a escola.
Educar na sociedade burguesa passou, então, a ser sinônimo de escolarizar. “Assim, não é por acaso que é exatamente a sociedade burguesa que vai levantar a bandeira da escola pública, universal, gratuita, obrigatória e leiga” (SAVIANI, 1999, p. 172). No entanto, sabe-se que ao passar o fervor revolucionário da burguesia, a defesa da escola pública para todos deixa de ser pauta da nova classe no poder. É nesse sentido que cabe uma reflexão sobre a escola pública na sociedade capitalista, a partir da qual também se introduz a discussão sobre a educação popular.
José Luis Sanfelice (2005) aponta que a escola que convencionamos chamar de escola pública é na verdade a escola estatal burguesa. Partindo da análise marxista do caráter de classe do Estado, o autor (p. 91) diz que:
Até é admissível que a escola estatal seja a forma pela qual se exerce a ação educativa do público, mas não necessariamente para o público. E público, em uma sociedade de antagonismos de classes, constitui-se em conceito ideológico, uma vez que escamoteia a existência de vários públicos. Para além do conceito de público, oculta-se a associação entre os que controlam o Estado e os que possuem e controlam os meios de produção.
O autor utiliza a passagem em que Marx, no texto A Crítica ao Programa de Gotha, critica a defesa de uma educação popular a cargo do Estado, o Estado como educador do povo, defendendo que “é o Estado que precisa ser rudemente educado pelo povo”. Concluindo que “o Estado ou o que é Estatal não é público ou do interesse público, mas tende ao favorecimento do interesse privado ou aos interesses do próprio Estado, com a sua autonomia relativa”. (SANFELICE, 2005,p. 91)
A leitura que Sanfelice realiza sobre os apontamentos de Marx, pode nos ajudar a compreender a necessidade de se superar o conceito restrito de educação popular como “educação para o povo”, oferecida pela escola organizada pelo Estado no atual estágio desenvolvimento das relações de produção e das forças produtivas na sociedade capitalista. Um conceito mais amplo de educação popular nos proporciona a compreensão do papel da escola na construção de um projeto de sociedade pautado nos interesses das camadas populares, pois “é essencialmente na ligação com os reais interesses populares que se define o caráter da educação popular”. (VALE, 2001, p. 58)
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Organizar a educação a partir dos interesses das camadas populares requer a superação de grandes desafios, extrapolando os muros da escola e abrangendo um projeto de transformação da sociedade como um todo. Para isso, um dos primeiros pontos é superar a visão restrita de educação. Nesse sentido, István Mészáros defende a necessidade de uma visão ampla de educação, que englobe o conjunto das ações formativas dos seres humanos.
Apenas a mais ampla das concepções de educação nos pode ajudar a perseguir o objetivo de uma mudança verdadeiramente radical, proporcionando instrumentos de pressão que rompam a lógica mistificadora do capital. Esta maneira de abordar o assunto é, de fato, tanto a esperança como a garantia de um possível êxito. Em contraste, cair na tentação dos reparos institucionais formais – “passo a passo”, como afirma a sabedoria reformista desde tempos imemoriais – significa permanecer aprisionado dentro do círculo vicioso institucionalmente articulado e protegido desta lógica autocentrada do capital. (MÉSZÁROS, 2005, p. 48)
Superar a lógica das reformas, das mudanças “passo a passo”, aparece, assim, como mais um dos desafios a ser superado por uma proposta de transformação radical da sociedade, uma proposta revolucionária. Tendo isso em vista, no próximo item discuti-se a educação enquanto internalização e a reconversão aos interesses dominantes que algumas das reivindicações populares estão sofrendo nas políticas sociais para a educação nos marcos do reformismo.
A EDUCAÇÃO COMO INTERNALIZAÇÃO E A RECONVERSÃO DAS REINVINDICAÇÕES DAS CAMADAS POPULARES
A década de 1990 é considerada como marco das reformas de cunho neoliberal2 no Brasil. Os governos Collor e Fernando Herinque Cardoso protagonizaram o alinhamento das políticas sociais à agenda internacional pautada na lógica do “Estado mínimo”. No contexto dessas políticas é que se identificam ações que demonstram o aprofundamento do uso da educação enquanto internalização e a reconversão de conteúdos das reivindicações populares em elementos de manutenção do capital.
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"2 Segundo Azevedo (1997, p. 11), o neoliberalismo “questiona e põe em xeque o próprio modo de organização social e política gestado com o aprofundamento da intervenção estatal. ‘Menos Estado e mais mercado’ é a máxima que sintetiza suas postulações, que tem como princípio chave a noção da liberdade individual, tal como concebida pelo liberalismo clássico”.
. De início, é importante atentar para a relação entre as políticas sociais e o
Estado, como definida por Eloisa de Mattos Hofling (2001, p. 31-32):
As políticas sociais – e a educação – se situam no interior de um tipo particular de Estado. São formas de interferência do Estado, visando a manutenção das relações sociais de determinada formação social. Portanto, assumem “feições” diferentes em diferentes sociedades e diferentes concepções de Estado. É impossível pensar Estado fora de um projeto político e de uma teoria social para a sociedade como um todo.
Tendo em vista o Estado sob a ordem capitalista vigente, as políticas sociais implementadas por esse Estado refletem a dominação de classe que o rege. Ou seja, essas políticas sociais objetivam a perpetuação dos interesses das classes dominantes sobre as camadas populares. Porém, se no Estado primitivo essa dominação de classe se deu através da força de seu aparelho repressor (exército), com o desenvolvimento das sociedades, principalmente do capitalismo, e o acirramento dos conflitos de classe, foi necessário que esse Estado, para manter o domínio de classe, buscasse forjar certo consenso através de seus aparelhos persuasivos ou ideológicos (Igreja, família, mídia, escola). No que diz respeito à educação, esse apontamento leva a dois desdobramentos importantes: 1) a educação utilizada como internalização dos valores culturais impostos por determinada classe social; 2) políticas educacionais que visam a criação de certo consenso a partir da apropriação de conteúdos retirados das reivindicações populares, reorganizados através dos elementos de manutenção do capital e devolvidos às camadas populares – processo que estamos chamando de reconversão. Passemos, então, a discutir brevemente esses dois pontos.
A questão da educação enquanto internalização é discutida por Mészáros ao historicizar o processo de desenvolvimento do capitalismo e as funções da educação durante o mesmo, indicando que nos tempos de acumulação primitiva, as garantias de reprodução do capital eram dadas através da força; com o desenvolvimento do capital, passa-se a usar a educação como internalização na garantia de reprodução do sistema.
Enquanto a internalização conseguir fazer o seu bom trabalho, assegurando os parâmetros reprodutivos gerais do sistema do capital, a brutalidade e a violência podem ser relegadas a um segundo plano (embora de modo nenhum sejam permanentemente abandonadas) posto que são modalidades dispendiosas de imposição de valores, como de fato aconteceu no decurso do desenvolvimento capitalistas moderno. Apenas em períodos de crise aguda volta a prevalecer o arsenal da brutalidade e da violência com o objetivo de impor valores, como o demonstraram em tempos recentes as tragédias dos muitos milhares de desaparecidos no Chile e na Argentina. (MÉSZÁROS, 2005, p. 41)
Esse processo de internalização não acontece sem contradições. No entanto, manter-se enquanto classe dominante tem sido o principal projeto da burguesia após o fervor revolucionário do século XVIII. Burguesia essa que não poupa esforços para se manter enquanto classe que detém o poder, cabendo às camadas populares organizar a resistência aos projetos de reprodução do capital.
No segundo ponto, as políticas sociais, em especial as educacionais, formuladas a partir dos conteúdos construídos ao longo dos processos reivindicatórios das camadas populares são convertidas aos interesses do capital e oferecidas novamente às camadas populares, num processo de reconversão. Encontra-se esse aspecto em diversas políticas educacionais no Brasil ao longo da história. Os governos recentes têm lançado mão dessa estratégia amplamente, como alternativa para o consenso e aparente neutralização dos conflitos de classe.
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Nesse sentido, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um dos maiores exemplos, até mesmo pela história de aproximação às camadas populares construída pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Como exemplo dessas políticas forjadas na lógica da reconversão, citaremos três programas: o Programa Universidade Para Todos (PROUNI), na esfera federal; o programa “Amigos da Escola”, organizado pela iniciativa privada; e, por fim, o Programa Escola da Família, gestado pelo Governo do Estado de São Paulo. Esses três programas, grosso modo, estão ligados às propostas contidas em documentos que animaram a reformas educacionais iniciadas na lógica do projeto neoliberal a partir da década de 1990 e também às duas bandeiras de movimentos ligados aos interesses das camadas populares, sendo elas: o aumento de vagas no ensino superior e a participação da comunidade na escola. De certa forma, o primeiro programa estaria ligado à primeira bandeira enunciada; o segundo à segunda bandeira; e o terceiro conseguindo reconverter as duas primeiras juntas. Passemos a examinar brevemente cada um desses programas.
O Programa Universidade Para Todos (PROUNI) foi criado em 2004 pelo Governo Federal e institucionalizado pela Lei no. 11.096/05. Seu objetivo é oferecer bolsa de estudos a alunos que tenham renda familiar inferior a três salários mínimos para realizarem cursos superiores em instituições de ensino da rede privada4. Essas instituições, por sua vez, são premiadas com isenções de impostos pelo Governo Federal. Para Roberto Leher (2004, p. 878):
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O PROUNI vem ao encontro dos mais ambiciosos sonhos das instituições filantrópicas, comunitárias, confessionais e empresariais de educação superior. Após décadas de isenções fiscais e da contribuição patronal para a Previdência Social (superior a 20% do custo da folha de pagamentos), benefícios que correspondem a um subsídio público de 25% em seus gastos totais, aporte que equivale à cerca de R$ 840 milhões ao ano, as instituições filantrópicas, que reúnem grande parte das maiores instituições de ensino superior do país, poderão fazer associações com empresas estrangeiras - a exemplo do que ocorre hoje entre o Pitágoras do ministro Walfrido Mares Guia e a Apollo International, vender patrimônio adquirido com isenções fiscais, como aviões, prédios, terrenos etc., remunerar os seus sócios, distribuir lucros e deixar o patrimônio como herança, tudo isso sem deixar de continuar a receber magnânimo apoio do Estado: mesmo na condição de instituições empresariais, gozarão de completa isenção de impostos, o que reduz em cerca de 15% os seus gastos em troca de modestíssimas vagas.
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Percebe-se, então, que o programa implementado pelo governo Lula sob o argumento de atender a uma reivindicação histórica das camadas populares, na verdade favorece aqueles que exploram a educação-mercadoria, a nova burgue sia de serviços, como bem definiu José Rodrigues (2007).
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O segundo programa citado como exemplo é o “Amigos da Escola – Todos pela Educação”, uma criação da Rede Globo de Televisão e afiliadas. Visa incentivar o envolvimento da comunidade escolar a partir de ações de voluntários que se propõe a realizar alguma atividade educativa para “melhorar” a educação e as condições de aprendizagem na escola. O Projeto tem apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Faça Parte, Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) 5. O que está por trás da “carinha” sorridente do slogan, é a desresponsabilização do financiamento da educação estatal por parte do Estado e a culpabilização de pais, funcionários e professores pela falta de qualidade no ensino dessas instituições. O que observamos é mais umas das reivindicações das camadas populares, qual seja, a possibilidade de participação da comunida de no acompanhamento da educação escolar de seus filhos, ser reconvertida em favor da manutenção da ordem societária que os oprime. Fabrica-se, assim, o consenso que são as próprias camadas populares os responsáveis pela falta de qualidade no ensino oferecido pelas escolas estatais no Brasil – problema estrutural, indissociável do caráter de classe do Estado.
Por fim, no Programa Escola da Família6 há reconversão das duas bandeiras das camadas populares enunciadas anteriormente: acesso ao ensino superior e participação da comunidade na escola. O programa criado pelo Governo do Estado de São Paulo concede bolsas de 100 e 50% de descontos para que jovens realizem seus cursos de graduação em universidades privadas. Em contrapartida, esses jovens devem dedicar seus finais de semana ao trabalho como monitores de atividades nas escolas da rede estadual. “Mata-se dois coelhos com uma cajadada só”, amplia-se o número de jovens no ensino superior e abre-se a escola para a comunidade usufruir o “espaço público” aos finais de semana. Novamente vemos por um lado o Estado financiando as instituições privadas e, por outro, utilizando-se de trabalho voluntário que deveria ser realizado por profissionais especializados e pagos pelos seus serviços. Cria-se, também, a ilusão de que a comunidade está participando da escola, quando na verdade essa mesma comunidade não tem poderes decisórios sobre os rumos daquela instituição. Além disso, o projeto priva os jovens do único momento de lazer do qual poderiam dispor, já que muitos durante a semana trabalham o dia todo e estudam no período da noite.
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Ao longo desse item procurou-se demonstrar como a educação é utilizada para a manutenção da sociedade de classes, seja através da internalização ou da reconversão. Longe de alimentar qualquer pessimismo em relação à educação, o intuito foi através do exercício da crítica, desvelar um obstáculo que deve superado para, pelo e no processo de construção da educação popular, que se efetiva no processo de construção de uma nova sociedade justa e igualitária.
CONSIDERAÇÕES: PERSPECTIVAS PARA A CONSTRUÇÃO DA EDUCAÇÃO POPULAR
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Procurou-se deixar claro o posicionamento que diz respeito à relação da educação e seus condicionantes sociais, políticos e econômicos. Essa perspectiva dialética auxilia a enxergar a educação como elemento determinado, mas também abre a perspectiva de um elemento determinado que pode influenciar seu determinante. Sob esse ponto de vista, a educação na sociedade capitalista é um dos instrumentos das classes dominantes para se perpetuarem no poder. No entanto, o referencial enunciado não nos deixa perder de vista a possibilidade revolucionária da educação quando esta cumpre seu papel de atualização histórico-cultural do seres humanos. Se for sobre a base da sociedade atual que construiremos uma sociedade de novo tipo. Se a velha sociedade está prenhe de uma nova. Então, é através da apropriação dos conteúdos histórica e coletivamente produzidos pelo conjunto dos seres humanos que poderemos pensar na formação do novo homem necessária a uma nova sociedade.
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Compreender a escola como forma predominante de educação na sociedade moderna, burguesa, ajuda a compreender a necessidade da ocupação dessa instituição pelas camadas populares, mas também nos amostra que a educação popular a se construir não deve se restringir às suas instituições formais. É preciso que a educação popular, organizada a partir dos interesses das camadas populares, extravase os muros das escolas, tomando os partidos e movimentos sociais populares, transformados em verdadeiros centros de cultura, na perspectiva gramsciana. É, enfim, necessário que a educação, para além do capital, seja continuada, abarcando toda a vida.
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Como perspectiva, ressalta-se a necessidade da construção da educação a partir do ponto de vista dos dominados. Superando-se as concepções restritas. Pois, dentro de um conceito restrito de “educação para o povo”, a educação popular pauta-se na lógica de oferecer o mínimo às camadas populares, um ensino que prepara somente para o ingresso no mercado de trabalho, oferecendo uma técnica que se diz neutra e preparando o “educando” para produzir mercadorias das quais ele não irá se apropriar.
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Faz-se necessário, por fim, o rompimento com o reformismo, que pretende transformações nos próprios marcos do capitalismo. Educação popular, assim, deve estar comprometida com a socialização das produções históricas e culturais da humanidade, dentro de um projeto de rompimento radical com as estruturas da sociedade capitalista, tendo em vista a completa emancipação humana.
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REFERÊNCIAS
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AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como política pública. Campinas: Autores Associados, 1997.
DUARTE, Newton. Vigotsky e o “aprender a aprender”: críticas às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2001.
HOFLING, Eloisa de Mattos. Estado e políticas (públicas) sociais. Cad. CEDES, Campinas, v. 21, n. 55, nov. 2001.
LEHER, Roberto. Para silenciar os campi. Educ. Soc. , Campinas, v. 25, n. 88, 2004
MÉSZÁROS, István. A educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2005.
RODRIGUES, José. Os empresários e a educação superior. Campinas: Autores Associados, 2007.
ROSSLER, João Henrique. A educação como aliada da luta revolucionária pela superação da sociedade alienada. In: DUARTE, Newton (Org.). Crítica ao fetichismo da individualidade. Campinas: Autores Associados, 2004.
SANFELICE, José Luis. Da escola pública estatal burguesa à escola
democrática e popular: considerações historiográficas. In: LOMBARDI, José
Claudinei; Saviani, Dermeval; NASCIMENTO, M.I.M. (Orgs.). A escola pública no Brasil: história e historiografia. Campinas: Autores Associados; HISTEDBR,
2005.
SAVIANI, Dermeval. Filosofia da Educação: crise da modernidade e o futuro da filosofia da práxis. In: FREITAS, Marcos Cezar de. (org.). A reinvenção do futuro: trabalho, educação, política na globalização do capitalismo. 2. ed. São Paulo: Cortez; Bragança Paulista: USF-IFAN, 1999.
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 8. ed. Campinas: Autores Associados, 2003.
SHIROMA, Eneida O.; MORAES, Maria Célia M. de; EVANGELISTA, Olinda. Política educacional. 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
TORRES, Rosa Maria. Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do Banco Mundial. In: TOMASI, Lívia et al. (Orgs.). O Banco Mundial e as políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 2000.
VALE, Ana Maria do. Educação popular na escola pública. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
1- Mestrando em Educação (FE/UNICAMP), sob orientação do Prof. Dr. José Luis Sanfelice e membro do Grupo de Estudo e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil” (HISTEDBR). End.: Av. Treze de Maio, 1040, Ap. 06, CEP: 14090-260, Jd. Paulista, Ribeirão Preto-SP, Brasil. E-mail: jefersonag@yahoo. com.br.
Grifos e imagens (PK)
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