18/07/2009

DIÁLOGOS

Dialogando com Paulo Kautscher – Marxismo e a Prática Sindical

Autor: Liu Sai Yam


Tentando lançar “pontes” entre o oportuno texto postado por Paulo sobre o panorama atual do sindicalismo, submetido a sistemático torpedeamento por parte da grande midia e setores blogueiros “modernos-realistas-moralizantes,”, na esteira também da ofensiva contra categorias profissionais inteiras (cuja justeza não é aqui objeto de discussão), cabe possivelmente uma reavaliação crítica do papel dos sindicatos como instrumento imprescindivel de organização do trabalho e disciplinação do capital, porem com vista à emergência de formas originais, inéditas, de luta política dentro de uma perspectiva de transformação concreta-real das relações de exploração articuladas pelo capitalismo.

Pedindo passagem, claro, a Sergião e vozes mais qualificadas em teoria e prática sindical, as linhas a seguir são apenas tentativas de recriar um debate pra fora e acima de programas políticos ou regimentos específicos.


A partir do momento em que o trabalho assalariado se generalizou (o proletariado afastado do controle da produção e submetido á dominação do capital) e se difundiram as grandes unidades produtivas industriais, que concentraram e uniformizaram grandes contingentes do operariado, o movimento sindical historicamente desempenhou, fora de qualquer dúvida (e ainda desempenha, em maior ou menor medida, o que depende em muito das circunstâncias), uma importante função político-pedagógica que pode ser considerada sob duplo aspecto.

1) Ensinou, mediante sucessivas experiências, formas e técnicas de organização e de luta pela defesa e promoção de interesses e reivindicações econômicas.

2) Contribuiu para o desenvolvimento da construção de elementos centrais que compõem a identidade coletiva da classe trabalhadora: a percepção do terreno socioeconômico e político comum que determina o ser do proletariado; as necessidades e interesses em comum que se enraízam nesse solo; a identificação e caracterização de seu oponente antagônico imediato: o capitalismo e/ou o Estado como seu elemento antitético estrutural/ocasional.

Fácil é reconhecer que o movimento sindical não costuma ser, em essência, diretamente político-revolucionário, no sentido de não se constituir de forma imediata em forma de luta negadora do capital e da sociedade burguesa.

Ao contrário, e normalmente, os primeiros desdobramentos da luta sindical, em qualquer tempo e lugar, são de caráter predominantemente econômico (engendrados pelos membros de uma unidade produtiva ou de uma categoria profissional), seja como defesa contra alguma ofensiva de degradação das condições de trabalho vigentes, seja como reivindicação propositiva de novos direitos e melhorias trabalhistas (aumento salarial, diminuição de jornada, salubridade, acréscimo de direitos...).

Embora não diretamente revolucionários, estes são os primeiros motivos a estimular um processo concreto de mobilização/aglutinação em torno de alguma forma de organização e luta de massas, princípios que carregam o potencial de se transformarem nos pilares que transferem (e sustentam) uma luta do plano econômico para o plano político.

Em outras palavras: no contexto de um movimento de organização e de luta por interesses predominantemente econômicos, pode-se trabalhar a consciência ideológica coletiva para formas de organização e luta políticas contra a sociedade burguesa/Estado.

Esse mesmo princípio se aplica aos movimentos sociais como MST, MTST e outros, sempre como possibilidade latente, que pode ou não se desenvolver dependendo de múltiplos fatores.

No caso do movimento sindical, entretanto, deve-se considerar que circunstâncias históricas mais recentes comprometeram sensivelmente o grau de sua potencialidade revolucionária. É importante mencionar 3 aspectos mais diretamente relacionados com o processo de reestruturação produtiva e do mundo do trabalho ao longo de todo o século 20:

- o desenvolvimento tecnológico da produtividade industrial, que substitui progressiva e continuamente capital variável por capital constante, acabou por determinar a diminuição da quantidade absoluta de assalariados necessários numa mesma unidade produtiva, o que acaba afetando diretamente no poder de mobilização e barganha desses contingentes.

- o encolhimento da quantidade de relativa de trabalhadores empregados em grandes unidades produtivas industriais, simultaneamente ao crescimento quantitativo proporcional de outros setores, especialmente o de serviços; o que, por muitas razões, enfraquece a eficiência da luta sindical.

Houve, na verdade, um processo de aguda complexificação e heterogeneização da classe trabalhadora (o avesso do que ocorrera nos primórdios do capitalismo industrial), que determinou ainda o crescimento expressivo de segmentos de trabalhadores informais, subempregados ou precários, assim como de desempregados, que em grande parte estão fora do alcance da atividade sindical.

- parte significativa dos empregos formais das grandes corporações é constituida por uma espécie de “elite” da classe trabalhadora, ou seja, segmentos de qualificação profissional mais elevada, renda mais alta e melhores perspectivas de carreira, o que torna mais problemática a possibilidade de comunhão com a identidade coletiva da classe trabalhadora como todo, além de tornar muito mais improvável a possibilidade de que manifestações sindicais destes segmentos ultrapassem a fronteira que separa a luta econômica imediata da luta político-ideológica contra a sociedade burguesa.

O movimento sindical já não é mais a única forma, nem a predominante, de passagem da organização e luta econômica para a organização e luta política.

Pela mesma razão, o proletariado industrial já não é mais potencialmente o único segmento revolucionário de vanguarda possível da classe trabalhadora.

Estas centralidades da aurora do capitalismo industrial já não correspondem mais aos resultados do processo de reestruturação do capital e do trabalho, complexificados e diversificados no seio do capitalismo amadurecido – e quase totalmente apodrecido.

Grandes contingentes da classe trabalhadora passam hoje ao largo da atividade sindical: os mais desqualificados, os mais pobres, os que menos tem a perder e tudo a ganhar.

Movimentos sociais espontaneamente nascidos em populações profundamente alienadas das políticas públicas e das esferas de lutas trabalhistas organizadas ganham a cada dia o papel de destaque nesse novo contexto de multipolaridade estratégica e organizativa.


Fonte: AQUI





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