18/09/2012

O fenômeno do Diário de Classe de Isadora Faber: um contraponto

Sei que com este post, vou me aventurar em outro campo que não é o da educação ambiental crítica (o foco do blog), mas é sobre educação, e me sinto a vontade para falar sobre esse assunto pois sou professora. É também uma reflexão sobre alguns fenômenos que ocorrem nas redes sociais, que apesar de eu não possuir uma profundidade teórica grande, exercito diariamente um olhar de observação sobre o que acontecem por aqui, no ciberespaço.
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Estou falando do mais recente fenômeno do facebook, e não é o da Gina Indelicada, rs, é sobre o Diário de Classe de Isadora Faber. Por conta desta reflexão ter se realizado em um curto espaço de tempo (alguns dias), desde que a nova intelectual da educação brasileira estudante de uma escola pública em Florianópolis, resolveu criar uma página no facebook para denunciar as mazelas da educação nacional.
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A página já conta com milhares de seguidores, que assim como a jovem, talvez possuam a melhor das intenções em querer “melhorar” a educação brasileira. Muitos se rasgam em elogios a Isadora, que sim, ao contrário de muitos jovens de sua idade, mostra um poder de crítica louvável, e a partir de um posicionamento político de denuncia, criou uma página para expor alguns problemas de sua escola (e não da educação brasileira, como muitos tem dito).
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Enfim, esse mais recente fenômeno do facebook, poderia passar sem uma crítica, mas acho que alguma coisa em minha cabeça sinalizou que existe algo errado nessa história toda, e pretendo ao menos listar os pontos que considero no mínimo incompatíveis, a minha adesão a esse fenômeno. Estando imersa em leituras sobre educação (por conta do mestrado), ou talvez por eu ser professora de escola pública,  o fato é, que eu tive outro olhar sobre essa questão.
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O intuito desta análise eu adianto, não é desmerecer a atitude da jovem, mas sim contribuir com algumas reflexões além, que acredito que ficaram perdidas no processo, aliás, acredito que diante de toda a repercussão, pouca gente tenha realizado um movimento de reflexão, um contrapondo… E por isso vou colocar o que  eu consegui alcançar:
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Em primeiro lugar tenho certa ressalva a quem faz denúncia vazia, sem uma reflexão das causas dos problemas, para mim isso não leva a nada, apenas a revoltas momentâneas e inconformismos futuros. Apontar alguns problemas da estrutura física da escola como por exemplo: porta sem maçaneta, bebedouro interditado e quadra sem manutenção, e dizer que esse é um grande problema na educação pública é no mínimo um erro, pior do que dizer são as pessoas acreditarem nisso. Isso é pouco, muito pouco comparado aos processos que levam a desvalorização sócio-histórica e depreciação da educação pública brasileira pelas classes governantes e elites dominantes. Claro que não queremos que uma jovem de 13 anos tenha o alcance dessa reflexão, mas ela é importante de ser lembrada e feita.
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O segundo ponto, me parece que a jovem fez algumas gravações dentro da sala de aula do professor de matemática, e alega que dentro de espaços públicos não tem que existir privacidade… Transcrevo aqui a fala dela: “Quanto as câmeras elas já fazem parte do nosso dia não tem o que discutir elas já estão por toda parte, numa instituição pública não podemos querer privacidade.” Peraí… Não é corporativismo vão, pois sou também professora, mas gravar aula de um profissional, colocar na internet, expondo e criticando o professor… Não me parece uma atitude ética. Será que o professor teve chance de se defender? Só a título de informação, o uso do telefone celular, e isso inclui câmeras é proibido dentro de sala de aula (pelo menos aqui no Estado do Rio de Janeiro, mas acredito que em outros Estados também). Bem Isadora, menos um ponto para você.
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Para não me estender muito, um último item. Uma coisa que chama atenção foi o contexto que a jovem estuda: Uma escola pública em Florianópolis, que apesar de alguns problemas na estrutura (fechaduras quebradas, quadra de esporte ruim, entre outros), e algumas divergências com os métodos dos professores… A escola possui um IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de  6,1 e 4,8  isso é índice de país desenvolvido… Só para compararmos, aqui no Rio de Janeiro o Governo do Estado ficou imensamente feliz por ter alcançado um IDEB de 3,2.
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Não é o caso da Isadora, mas muitos que falam da escola pública, não conhecem a realidade de como é a educação nesses espaços. O que a jovem está fazendo é interessante, do ponto de vista da denúncia, do ciberativismo, mas volto a dizer sem reflexão se torna vazio, mais por parte dos que estão curtindo, do que dela mesma, afinal ela é apenas uma adolescente… A questão da escola pública em nosso país vai muito além e é muito mais grave do que está sendo denunciado no Diário de Classe de Isadora. Bom para ela que alguns dos problemas de sua unidade escolar tenham sido resolvidos com as denúncias, mas e as demais escolas de Florianópolis? E as demais escolas de Santa Catarina? E do Brasil?
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Será que os problemas por ela denunciados, eram realmente graves em um país cuja realidade da educação é extremamente desigual? O que é uma porta pichada, uma maçaneta quebrada  quando se tem um IDEB de 6,1? Será que todas as escolas do Brasil estão nesse nível?
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Espero ter contribuído com essas reflexões, sobre a página do facebook Diário de Classe de Isadora Faber, sobre algumas fragilidades que se puseram em sua ação, e mais ainda na construção de como esses fenômenos da internet, às vezes, são anunciados como salvadores (ouvi gente dizendo que é a revolução no ensino público), inspiradores (alguns na verdade o são), mas que precisam ser pensados antes de ser curtidos sem nenhum tipo de reflexão prévia.
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Um comentário:

  1. Que tal voltar para a sala de aula? Como professora poderia ao menos escrever corretamente para não denegrir ainda mais a imagem de nossa classe?

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