Entra governo, sai governo, e as crianças e jovens permanecem à mercê dos caprichos das autoridades. Não faltam planos nem especialistas em ditar o que deve ser feito para melhorar a educação. Há exceções: almas de boa vontade que provavelmente Dante não colocaria no inferno. Mas, no inferno dantesco bem que caberiam muitos dos que reproduzem e perpetuam a realidade de exclusão social, e torturam os corpos e almas dos nossos jovens e crianças com exigências inúteis e demonstrações de autoritarismo, transformando vidas num inferno desconhecido para o autor de A Divina Comédia.
Uma conversa sincera com uma criança ou um jovem indica que, em muitos casos, a sala de aula mais se assemelha a uma prisão. O aluno, como o preso em liberdade condicional, vê-se obrigado a comparecer diariamente, ouvir o que não quer e fazer o que não gosta. Prevalece o desprazer, impera o medo e os abusos de autoridade. Ao invés de reconhecer no professor a autoridade legítima, o apoio que necessita para o crescimento intelectual, o aluno vê-se diante da alternativa de obedecer e se submeter aos caprichos de profissionais sem a mínima vocação e preparo para a árdua, porém, sublime, tarefa de educar; ou, ao contrário, rebelar-se e sofrer as conseqüências e os estigmas. Isso é particularmente grave em relação às crianças mais tímidas, as quais sofrem mais intensamente e se sentem desprotegidas. Para elas, a falta do professor ou a mudança para outra escola é um alívio.
Qual deve ser a atitude do aluno diante do professor que grita, chama-o de burro e outros epítetos e não o respeita? Como deve reagir o aluno quando o professor abusa da autoridade? O que explica, caro professor, que seu colega consiga manter a disciplina da turma, dar a aula e conquistar o respeito dos alunos, sem precisar gritar, ameaçar com provas surpresas, diminuir a nota ou expulsá-los da sala? Será que você não confunde respeito com medo e autoridade legítima com autoritarismo? O que se pode esperar do processo educativo quando o professor se impõe pelo terror e exigências absurdas, como trabalhos e provas de caráter punitivo?
Qual deve ser a atitude do aluno quando percebe que o professor não prepara a aula, não tem didática, não formula adequadamente as questões da avaliação ou exige conteúdos não trabalhados em sala de aula (ou não discutidos como deveria); ou, ainda, pede trabalhos sem explicar o que realmente deseja? O que se pode esperar de professores cuja tarefa consiste apenas e unicamente num meio de vida, num trabalho assalariado como outro qualquer, e que, sem qualquer vocação para serem educadores, projetam seus descontentamentos, neuroses e fracassos, na relação com seus alunos, infernizando as suas vidas? Como reagir diante de profissionais que humilham seus alunos dizendo que, por estudarem em escolas públicas, estão condenados ao fracasso e, assim, jogam ladeira abaixo a auto-estima deles?
Se um avião cai ou um prédio desaba, procuram-se os culpados; se o time perde insistentemente, a torcida logo encontra o culpado (coitado do técnico!). Porém, se os alunos vão mal, a culpa é deles. Talvez sejam indolentes ou não inteligentes o suficiente para compreender o tão inteligente e genial professor. Será que as dificuldades de compreensão ou repetência da maioria dos alunos é sinônimo de rigor professoral? Se considerarmos que a função do professor é ensinar, isso é um contra-senso.
Claro, tudo isto também diz respeito ao ensino superior. Fico abismado ao ver como o habitus escolar se reproduz na universidade – com o agravante do fortalecimento do poder professoral pelos títulos acadêmicos. O autoritarismo dos doutos também é grave e traumatizante.
Fonte: http://antoniozai.wordpress.com/
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